27 de agosto de 2013

Clube do Livro (Agosto): A Luneta Âmbar

- O que pensei foi que se você... talvez apenas uma vez por ano... se pudéssemos vir aqui ao mesmo tempo, para passar uma hora ou coisa assim, então poderíamos fazer de conta que estávamos juntos de novo... porque estaríamos juntos, se você sentasse aqui e eu sentasse bem aqui no meu mundo...

– Isso – disse ele – enquanto eu viver, sempre voltarei aqui. Não importa onde eu esteja no mundo, voltarei aqui.

– No dia do Solstício de Verão – completou ela. – Ao meio-dia. Enquanto eu viver. Enquanto eu viver...
E com esse épico terceiro volume, chegamos ao final da série Fronteiras do Universo, que estivemos lendo ao longo dos últimos três meses no Clube do Livro, com reações a emoções variadas – porque Pullman é daqueles autores que gosta de torturar os pobres mortais que se dispõem a ler seus livros.

A Luneta Âmbar é não apenas o épico final da trilogia, mas também marca o retorno com destaque para alguns dos melhores personagens da história, incluindo o mais que querido Iorek Byrnison e o surgimento de tantos outros novos nomes, como os Mulefas, Lorde Roke (eu adoreiiiiiii esse personagem) e a voz de Deus, Metraton.

Finalmente temos a resposta sobre o que é o Pó, sobre o que significa a profecia que envolve Lyra, sobre o papel de Will na batalha brutal contra o Reino dos Céus... O livro inteiro é intenso, de tirar o fôlego, com passagens memoráveis e uma filosofia surpreendente.

Da jornada pessoal de Will em busca de Lyra, do papel que Mrs. Coulter passa a representar – é não é surpreendente a reviravolta da personagem? -, da tensa espera da Dra. Malone para assumir seu papel de ‘tentadora’, da caminhada pelo reino dos mortos... não há um minuto em que não estejamos de fôlego suspenso com os acontecimentos que se desdobram nas páginas desse último volume.

Há três momentos em particular na história que são, para mim, o supra-sumo da genialidade de Pullman: a troca que Lyra faz com as Harpias, a forma como ela as seduz com sua capacidade de contar histórias; o confronto final de Lorde Asriel e Mrs. Coulter que, francamente, me deixou tonta-maluca-quase-chorando e o final na praia, o ‘temos de construir a República do Céu aqui’.

O ponto central da história, porém, é mais do que a soma de todas essas cenas de virar a cabeça de qualquer leitor desavisado. A trilogia de Pullman é uma amálgama de mito, religião e filosofia, em que a Gênese bíblica é questionada a partir do ponto em que a tentação da serpente e a ‘queda’ não são o real início da miséria humana – pelo contrário, a repressão da Autoridade (representada no mundo de Lyra pelo Magisterium que está por trás da Igreja) é que está em confronto que a liberdade de pensamento e conhecimento.

A maçã de Eva – e o Marzipã de Lyra – são o fim da inocência, sim... mas são também o momento em que recebemos o dom do livre-arbítrio. Sem conhecimento, sem liberdade de escolha, somos apenas marionetes – eis o que diz Pullman de fato em seus livros (livros pelos quais em outra época ele teria sido queimado na fogueira, certamente).

E Pullman consegue transmitir essa mensagem admiravelmente, com personagens fascinantemente reais. Por mais que a história de Fronteiras do Universo seja uma fantasia, num mundo de bruxas, ursos de armadura, harpias, daemons e outras tantas estranhas criaturas, o fato é que somos completamente envolvidos por essas figuras, por seus dilemas, por suas crenças, por suas paixões.

Nós ficamos emocionalmente investidos de qualquer maneira porque, independente do rótulo, pés, patas ou rodas, todos os personagens da história representam facetas humanas.

Um final extremamente digno para uma trilogia apaixonante, uma das melhores fantasias literárias que conheço, sem dúvida alguma.


A Coruja


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